A criação do Bitcoin foi inspirada por várias tecnologias e pessoas. Por exemplo, Nick Szabo contribuiu com o conceito de “bit gold,” uma forma de dinheiro digital descentralizado. Hal Finney desenvolveu o Reusable Proof of Work (RPOW), que teve uma influência direta no mecanismo de prova de trabalho do Bitcoin. Além disso, Wei Dai propôs o “b-money,” uma ideia de moeda digital que compartilha várias características com o Bitcoin e David Chaum introduziu conceitos fundamentais como assinaturas cegas e eCash, precursores das transações digitais anônimas.
Todos esses conceitos foram debatidos e refinados pela comunidade dos cypherpunks, um grupo de ativistas e criptógrafos dedicados a desenvolver projetos ligados à privacidade e segurança digital.
Assim, a colaboração e as discussões entre esses visionários foram essenciais para a formulação da proposta revolucionária de Satoshi Nakamoto em 2008, que resultou na criação do Bitcoin.
Neste artigo, você vai descobrir mais sobre a história de David Chaum, entender como ele é uma figura central no campo da criptografia e da privacidade digital e qual é a sua relação com o Bitcoin.
Bora lá?!
Quem é David Chaum?
Nascido em 1955, David Chaum é um matemático e criptógrafo americano que, ao longo de sua carreira, tem se dedicado a desenvolver soluções inovadoras para problemas de segurança e privacidade na internet e transferência de informações de valor.
Ele concluiu o doutorado em Ciência da Computação na Universidade da Califórnia, Berkeley, em 1982. Em sua tese, chamada “Sistemas Computacionais Estabelecidos, Mantidos e Confiáveis por Grupos Mutuamente Suspeitos”, Chaum estabeleceu as bases para muitos de seus futuros projetos.
Além disso, desde o início, David Chaum já havia percebido a importância de desenvolver sistemas que possibilitassem transações seguras e anônimas na internet.
Sendo assim, bora entender as suas principais criações:
As principais criações e contribuições de David Chaum
1. Redes de mistura (comunicação anônima)
Chaum introduziu o conceito de redes de mistura (mix networks) em seu artigo de 1981, “Untraceable Electronic Mail, Return Addresses, and Digital Pseudonyms“.
As redes de mistura ou mix networks permitiam que um grupo de remetentes enviasse mensagens criptografadas a um servidor, onde as mesmas seriam embaralhadas e reembaralhadas, dificultando o rastreamento da origem e do destino das mensagens.
Esse sistema garantia o anonimato na comunicação e foi a base para a criação de ferramentas como o Tor.
2. Sistemas de votação confiáveis
Uma outra contribuição de Chaum foi para sistemas de votação seguros e verificáveis, incluindo a primeira proposta em 1981 de um sistema que permitia a verificação de ponta a ponta da contagem de votos enquanto mantinha a privacidade dos votos individuais.
3. Assinaturas Cegas
Em 1983, Chaum publicou um artigo chamado “Blind Signatures for Untraceable Payments”, que introduziu o conceito de assinaturas cegas.
Basicamente, essa tecnologia permite que uma entidade assine um documento sem conhecer seu conteúdo, possibilitando transações anônimas e seguras. Esse trabalho foi fundamental para o desenvolvimento de sistemas de pagamento eletrônico.
4. eCash
Em 1990, ele fundou a DigiCash Inc., uma empresa que implementou o conceito de dinheiro digital através do eCash, um dos primeiros sistemas de pagamento eletrônico a usar criptografia para garantir a privacidade dos usuários.
O eCash permitia que os usuários transferissem dinheiro digital de forma segura e anônima. Assim, os bancos participantes emitiam “notas digitais” criptografadas para os clientes, que poderiam ser armazenadas em seus computadores pessoais. Portanto, para realizar um pagamento, o cliente enviava essas notas digitais ao comerciante, que, por sua vez, as encaminhava ao banco para verificação e depósito.
As assinaturas cegas garantiam que o banco não pudesse rastrear a transação de volta ao cliente, mantendo assim o anonimato.
O primeiro banco a adotar o eCash foi o Mark Twain Bank, em St. Louis, Missouri, nos Estados Unidos, em 1995. Entretanto, apesar do interesse inicial e da adoção por alguns bancos e comerciantes, o eCash enfrentou diversos desafios.
Naquela época, as pessoas tinham receio de usar cartões de crédito para compras online de bens e serviços, sem contar que a demanda por tais serviços ainda era baixa, e o comércio eletrônico só começou a ganhar força na segunda metade dos anos 90.
Além disso, a infraestrutura necessária para suportar o sistema do eCash era complexa e a falta de uma rede ampla de comerciantes que aceitassem a moeda digital limitava sua utilidade prática.
Ainda assim, mesmo com todas as adversidades, David Chaum recebeu várias propostas de parceria para a DigiCash.
A Visa mesmo ofereceu 40 milhões de dólares pelo projeto, e a Netscape queria integrar o eCash em seu navegador. Até Bill Gates demonstrou interesse em incluir a moeda digital em todas as instalações do Windows 95.
No entanto, Chaum considerou insuficiente a oferta de 100 milhões de dólares feita pela Microsoft para adquirir os direitos da tecnologia. Em resposta, ele fez uma contraproposta: em vez de aceitar o valor proposto, pediu dois dólares por cada cópia do Windows 95 vendida.
Essa exigência tornou inviável qualquer possibilidade de acordo com a Microsoft.
Assim, em 1999, a DigiCash encerrou suas atividades, marcando o fim do eCash e embora o eCash não tenha alcançado o sucesso esperado, foi uma inovação pioneira que inspirou o desenvolvimento do Bitcoin.
5. Sistemas de cofre
A dissertação de David Chaum em Berkeley, 1982, descreveu os fundamentos da tecnologia blockchain, que são usados no Bitcoin, com exceção da prova de trabalho.
Assim, o sistema de cofre proposto por ele incluia métodos para alcançar consenso entre os nodes, organizar o histórico de consenso em blocos e carimbar temporalmente os dados de maneira imutável.
Isso já em 1982!!
6. Outras contribuições
Além dessas criações, David Chaum também propôs o sistema de credenciais anônimas em 1985, contribuiu para o desenvolvimento do argumento de conhecimento zero e do esquema de compromisso em 1988 e 1991, respectivamente, e também apresentou conceitos importantes em criptografia e segurança da informação ao longo de sua carreira.
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O legado de David Chaum e o surgimento dos Cypherpunks
Apesar da falência da DigiCash, as ideias e tecnologias desenvolvidas por David Chaum deixaram um legado.
O trabalho pioneiro de Chaum serviu de inspiração para uma comunidade de criptógrafos e hackers que se reuniam em um fórum online para discutir e desenvolver novas tecnologias.
Este grupo, que incluía antigos colaboradores da DigiCash e figuras ilustres como Hal Finney e Nick Szabo, ficou conhecido como os cypherpunks.
Quem são os Cypherpunks?
Os cypherpunks são uma comunidade de ativistas, criptógrafos e hackers que defendem o uso da criptografia como ferramenta essencial para proteger a privacidade e a liberdade individual na era digital.
Surgindo no final dos anos 80 e início dos anos 90, os cypherpunks defendem que a criptografia é essencial para proteger os indivíduos contra a vigilância de governos e corporações. Além disso, eles acreditam que esta tecnologia é fundamental para garantir a liberdade de expressão e a segurança das comunicações.
Assim, os cypherpunks mantiveram vivo o sonho de um sistema de dinheiro eletrônico privado e descentralizado.
Durante os anos 90 e início dos anos 2000, eles propuseram várias alternativas de sistemas monetários digitais, explorando diversas maneiras de criar transações seguras e anônimas sem a necessidade de intermediários.
O Bitcoin surgiu diretamente dessas discussões, inovações e filosofia dos cypherpunks.
Inspiração para o Bitcoin
Em 2008, cerca de dez anos após o encerramento da DigiCash, Satoshi Nakamoto apresentou uma proposta revolucionária de dinheiro eletrônico: o Bitcoin.
Esta nova moeda digital integrou muitos dos conceitos desenvolvidos por David Chaum, bem como os princípios defendidos pelos cypherpunks, incluindo assinaturas digitais, funções de hash e redes peer-to-peer.
Assim, as assinaturas digitais e a criptografia, áreas nas quais Chaum foi pioneiro, são componentes fundamentais na arquitetura do Bitcoin.
Mate seus heróis!
Quem pensa que David Chaum se aposentou está enganado! Ele continua na ativa e, surpreendentemente, já tentou até descredibilizar o Bitcoin.
Em 2018, durante uma conferência em Singapura, ele apresentou o projeto Elixxir, uma criptomoeda que descreveu como sendo rápida, segura e escalável, e que, segundo ele, seria melhor que o Bitcoin.
Além disso, também criou um outro projeto chamado Praxxis, que segundo ele, é uma moeda digital de alto desempenho, apoiada por uma blockchain resistente a ataques quânticos.
A frase mate seus heróis é verdadeira e se aplica bem aqui.
Portanto, apesar de David Chaum ter inspirado a criação do Bitcoin, o fato de ele ter desenvolvido uma moeda para competir com ele indica que, mesmo sendo um criptógrafo experiente e dedicado à privacidade dos usuários, ele não compreendeu completamente a singularidade e as propriedades inimitáveis do Bitcoin.
De todo modo, a contribuição de Chaum foi significativa, e Satoshi soube aproveitar os conceitos desenvolvidos por ele de forma exemplar, combinando diversos elementos para construir uma ideia revolucionária e brilhante que continua a transformar nossa era financeira e tecnológica.
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Fundadora da Area Bitcoin, um dos maiores projetos de educação de Bitcoin do mundo, publicitária, apaixonada por tecnologia e mão na massa full time. Já participou das principais conferências de Bitcoin como Adopting, Satsconf, Surfin Bitcoin e Bitcoin Conference.
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